domingo, 23 de março de 2014

Após quase 4 anos sem investir no Metrô de Brasília, (des)governo de Agnelo e Filippelli resolver realizar uma estranha licitação para comprar trens fora do padrão, com riscos aos passageiros e suspeitas de sobrepreço.


No meio da semana que o PMDB de Filippelli emparedou a presidente Dilma Rousseff, a Presidência da República anunciou a liberação de R$ 1 bilhão e  590 milhões de reais para construir mais um corredor de ônibus, desta vez de Planaltina e Sobradinho ao Plano-Piloto, além de 10 trens para o Metrô-DF e 10 VLTs para a futura linha que em existe ainda.

O Correio Braziliense publicou esse quadro com base nas informações prestadas pelo (des)governo do DF. Nos surpreende os valores fora do mercado dos preços dos trens de metrô e VLTs:            R$ 22 milhões cada trem do metrô e R$ 12 milhões cada trem de VLT.


Tudo isso está envolvido em fortes indícios de superfaturamento, direcionamentos de fornecedores e desperdício de milhões de reais em obras desnecessárias, como os BRTs.

Tudo começou com a constatação pelo núcleo interno do governo PT-PMDB do Distrito Federal que o sistema de corredores de ônibus do Gama e Santa Maria ao Plano Piloto (BRT Sul) não fará grande diferença ao passageiro, já que a exigência de transbordo comerá toda a alegada vantagem das pistas livres. Pior ainda, não poderão encerrar a obra antes das eleições. Por que? Porque se a obra se encerrar, fecharão também as torneiras das doações das empreiteiras. O corredor de ônibus sul, que começou custando R$ 533 milhões, após uma auditoria do Tribunal de Contas do DF que rebaixou o valor inicial de quase R$ 580 milhões, já ultrapassou os R$ 1 bilhão de reais.

Isso quer dizer que cada kilometro dos 35 km de corredores já está custando mais R$ 28 milhões e continua a subir sem parar. Agora, estão reformando a rodoviária do Plano-Piloto em mais uma obra milionária, de custo não divulgado, já que não há placa com o valor inicial, para receberem os ônibus articulados com portas do lado esquerdo, os "Trambolhões". Para dar uma comparação, os Batalhões de Engenharia do Exército Brasileiro constroem estradas no nordeste ao custo de R$ 2 a 4 milhões por km.

Atualmente, esse preço já seria o custo de um Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), o bonde moderno, com capacidade para 500 passageiros, enquanto que os ônibus Trambolhões levam 160 passageiros. Há algo muito estranho...

Mesmo sabendo disso, o governo federal anuncia a liberação de R$ 795 milhões em dotações (entenda doação mesmo) ao (des)governo do DF e outros R$ 795 milhões em empréstimos, num total de R$ 1 bilhão e 590 milhões para um segundo corredor de ônibus, exatamente sobre o que seria linha 4 do Metrô-DF, que é a linha Planaltina-Sobradinho-Colorado-Asa Norte. Isso é mais uma parte do projeto de matar as linhas do metrô, já que o BRT Sul foi feito em cima da linha 2 do metrô, para matar o projeto e metrô ao Gama e Santa Maria.

SUSPEITAS


Agora, vamos às noticias suspeitas. O Correio Braziliense publicou no dia 14 de março uma matéria com a descrição de cada item contemplado com essa liberação de R$ 1,5 bilhão. No caso do metrô, seriam  R$ 220 milhões para a compra de 10 trens.  Aí começou uma suspeita grave: como se sabe agora o valor dos trens que ainda não foram comprados? Mais ainda, por que esses trens estão custando R$ 22 milhões a unidade, se segundo o Tribunal de  Contas da União, o preço médio de um trem de seis carros (vagões) tem sido entre R$ 12 e 15 milhões?

Fomos checar dentro do Metrô-DF e descobrimos uma notícia assuntadora: a diretoria do Metrô-DF, junto com o vice-governador Nelson Tadeu Filippelli (que é que manda de verdade dentro do des-governo do DF) decidiram comprar trens de 6 carros. Isso seria muito bom pois levariam 2 mil passageiros, só que as plataformas do Metrô-DF foram construídas para trens com 4 carros e 2 carros vão ter de parar fora das plataformas.

E o que isso significa?

Significa que o Metrô-DF vai abrir mão da segurança e usar trens com portas internas para os passageiros embarcarem em um carro (vagão) e terem de caminhar por dentro para irem para o outro carro (vagão).

E por que isso abre mão da segurança?

Por que o piloto vai parar seu carro fora da plataforma, sem ver os passageiros entrando e saindo e sair sem ter visto se todos os passageiros já entraram e saíram. E tem mais. Os metrôs mais modernos não costumam usar portas internas para impedir que um elemento perigoso, um marginal, possa fugir de um carro pra outro e escapar. Os carros isolados não agradam aos marginais que sabem que estão presos entre uma estação e outra.
Em um trem do tamanho da plataforma, o piloto para o trem inteiro na plataforma, visualizando toda a operação. Em um trem maior que a plataforma, o piloto não vê a entrada e a saída dos passageiros, aumentando o risco de acidentes.

E como se não fosse pouco, a direção do Metrô-DF não colocou no edital do concurso a contratação de pilotos e de controladores de tráfego. Então quem vai pilotar e controlar esses trens? Há uma suspeita que a direção do Metrô-DF queira estrear em Brasília um sistema de telecomando automático de trens (A.T.O.) para evitar a contratação de pilotos e controladores. Esse sistema existe no Metrô-SP, mas não é confiável na prática, pois todos os trens paulistanos operam com pilotos. E a presença desses pilotos já impediu vários acidentes, quando o ATO não funcionou em um trem com 2 mil passageiros que quase se chocou com outro trem com 2 mil passageiros.

O Metrô-DF está envolvido nos casos de cartéis da Alstom e Siemens,  em que essas empresas corromperam dirigentes e políticos para compra e manutenção de seus trens. A Siemens fez um acordo judicial para colaborar com a justiça e diminuir sua punição. E uma das fontes de corrupção era justamente o sobrepreço dos trens.

E quanto aos Veículos Leves sobre Trilhos (VLTs), os bondes modernos? A destinação de 120 milhões para sua aquisição não é importante? Claro que sim, mas a linha não foi construída ainda e os VLTs já estão sendo comprados? A projeto do VLT foi alterado durante o governo José Roberto Arruda pelo então presidente do Metrô-DF Jose Gaspar de Souza. Os valores ultrapassaram R$ 1 bilhão e 100 milhões em 2009, até que o Ministério Público e a Polícia Civil do DF descobriram um grande esquema de superfaturamento e direcionamento às empresas TCBR e Alstom, no que foi conhecida como Operação Bagre.

O projeto do VLT de Brasília não está definido, mas já se definiu os seus trens? E já se sabe até o seu preço de R$ 12 milhões por unidade? Muito estranho, muito estranho...Um bonde VLT tem custado aproximadamente R$ 5 milhões na configuração de 500 passageiros, que era o modelo previsto inicialmente para a Linha 1 do VLT de Brasília. Entretanto o governo federal e o (des)governo do DF já sabem que independente do projeto da Linha 1, independente do sistema de energização, independente das características técnicas do VLT, cada composição irá custar R$ 12 milhões.

Outra ciosa que chama a atenção é que o túnel da Asa Norte já existe e hoje chega onde é a Galeria do Trabalhador, em frente ao Hospital Regional da Asa Norte. Só que não se constrói a estação, embora se existisse seria extremamente útil.

O projeto de prosseguimento do Túnel Asa Norte é exatamente a continuação do Túnel Asa Sul: um túnel mineiro do novo sistema austríaco, em que a escavação é feita e seguida da concretagem em anéis de 1 metro a 1,5 metro de extensão. Rápido e já dominado pelo Metrô-DF. Como é que se precisa gastar R$ 75 milhões em projeto básico e executivo?

ACIDENTES E SUCATEAMENTO

Desde 2008, os governos Arruda-Paulo Octavio, Rogério Rosso (2010) e Agnelo-Filippelli (2011/2014) fizeram a opção em abandonar o metrô em prol dos ônibus, em uma aliança que juntou os donos de empresas de ônibus,  as empreiteiras de rodovia, as montadoras de ônibus, as concessionárias de veículos, as construtoras de Brasília e um grupo político que uniu PT e o PMDB para buscar recursos no PAC da Mobilidade.

Em Brasília, o Metrô-DF suspendeu todas seus projetos de expansão, abertura de estações incompletas, manutenção de sua estrutura e o mais importante - contratação e treinamento do pessoal que opere o sistema - os metroviários.

Em primeiro lugar, a Linha 2 do metrô, que ligaria Gama e Santa Maria ao Plano-Piloto foi substituída por um projeto de corredores de ônibus, que passaram a ser chamados de BRT. Um nome em inglês que não existe nem nos EUA, nem na Inglaterra. Apenas no Brasil, para enganar os trouxas.

Entrada do Eixo W da estação 106 Sul. Na Asa Sul há três estações que as direções do metrô-DF evitam terminar: 104, 106 e 110 Sul. Em Águas Claras há a estação Estrada Parque e em Taguatinga há a estação Onoyama. Se essas estações funcionassem, mais de 60 mil passageiros usariam o metrô por dia. Bom para a população e ruim para o esquema dos ônibus, que o (des)governo do DF tem apoiado.

Assim,  as estações da 104, 106 e 110 Sul foram congeladas, ficando inacabadas. Sendo que a 106 fica em frente ao Cine Brasília e a 110 fica em frente ao antigo Cine Karim, dois locais extremamente favoráveis à abertura das novas estações. Surpreendentemente, essas estações foram listadas e reservadas a fortuna de 75 milhões (25 milhões para cada uma) para serem terminadas, sendo que a avaliação inicial era de 10 milhões. Mas ainda fica a pergunta: quem vai operá-las, se o Metrô-DF precisa de mais 1.600 funcionários e o concurso público contrata apenas 245 funcionários?

As estações da Estrada Parque, em Águas Claras, embora pronta é mantida fechada, sem manutenção, se degradando a cada dia. E a futura estação Onoyama, bem no cruzamento da av. Elmo Serejo com a pista de Samambaia fica incompleta, silenciosamente escondida.

E como a manutenção estava entregue ora a Alstom, ora a Siemens, ambas as empresas envolvidas na Máfia do Superfaturamento dos Trens, a qualidade está cada dia pior, já tendo o Metrô-DF em três anos tido três acidentes gravas: um descarrilhamento de um trem no Terminal Ceilândia e o incêndio de dois trens por sobrecarga, um em Samambaia e outro na Ceilândia. O caso do incêndio do trem na Ceilândia foi o mais grave, pois estava com passageiros e o piloto habilmente conseguiu levar o trem até a estação Guariroba e evacuar os passageiros.

Esse foi o segundo trem que pegou fogo por sobrecarga elétrica. mais uma vez, o sistema de rebaixamento de eletricidade não rebaixou a voltagem corretamente e iniciou um incêndio no trem. Em três anos, três incêndios, sendo que em dois casos houve a perda de dois trens.

E se fosse um trem sem piloto? O que teria ocorrido? Morte de centenas de passageiros?

No dia 20 de março, mais um incidente. Desta vez na estação Praça do Relógio. Um trem lotado sofreu pane e ficou paralisado dentro do túnel. Várias pessoas passaram mal por calor, tempo em pé, nervoso etc. e tiveram de ser socorridas.

Os passageiros que passaram mal eram retirados e atendidos na plataforma. Os que aguentavam, permaneciam no trem lotado. Isso não é uma política correta de se transportar passageiros no melhor meio de transporte da cidade.


quarta-feira, 28 de agosto de 2013

O repórter que descobriu o delator da Siemens

O jornalista Bryan Gibel veio de Berkeley para investigar a corrupção no metrô de São Paulo. Foi ele quem publicou pela primeira vez a carta e entrevistou o ex-executivo que revelou o escândalo
por Agência Pública — publicado 25/08/2013 09:06
Jornalista-Bryan-Gibel-veio-de-Berkeley-para-investigar-a-corrupção-no-metrô-de-São-Paulo-há-três-anos.jpg
Fluente em português, o jornalista veio ao Brasil quando um professor falou sobre investigar um escândalo de corrupção, envolvendo centenas de milhares de dólares
Em um dia frio e nublado em São Paulo, entrei em um escritório bagunçado, escondido nos meandros da Assembléia Legislativa, e me vi diante do ex-executivo da Siemens que há mais de um mês eu tentava localizar. Dois anos antes, esse homem de identidade sigilosa havia entregue a deputados do PT documentos que descreviam minuciosamente como dois dos maiores conglomerados europeus – a francesa Alstom e a alemã Siemens – tinham distribuído propinas por mais de uma década para conseguir contratos de construção e operação das linhas de metrô e do sistema de trens da região metropolitana de São Paulo. Os documentos tinham sido enviados pelo PT, em agosto de 2008, ao Ministério Público de São Paulo, que já participava de uma investigação sobre a Alstom a convite de autoridades suíças.
Depois que me apresentei, ele disse que eu era o primeiro repórter com quem falava sobre Alstom e Siemens, e que me daria a entrevista com a condição de manter o anonimato, porque temia por sua segurança. Também me entregou cópias de duas cartas escritas por ele, relatando, em detalhes, como Siemens, Alstom e outras companhias multinacionais no Brasil haviam pago propinas e formado cartéis ilegais para ganhar contratos públicos de milhões de dólares em São Paulo e Brasília. Contratos e documentos sustentavam a denúncia, e nomeavam os políticos e funcionários públicos que, segundo ele, tinham recebido dinheiro – havia até informações bancárias sobre os pagamentos ilícitos.
Hoje, passados mais de 3 anos, aquele encontro ganhou um novo significado. Em maio deste ano, as investigações sobre corrupção que até então envolviam a Alstom culminaram em um grande escândalo no Brasil depois que, em troca de imunidade, a Siemens e seus executivos passaram a colaborar com o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), órgão vinculado ao Ministério da Justiça, dando depoimentos e entregando documentos que indicam que a Siemens e mais de 20 pessoas pagaram propinas e formaram cartéis ilegais para ganhar contratos do governos do Estado de São Paulo e do Distrito Federal de quase R$ 2 bilhões.
As cartas e documentos que o ex-executivo da Siemens me entregou em São Paulo retratavam esse quadro de distribuição de propinas e corrupção em larga escala no setor metroferroviário brasileiro. Muito do que está sendo dito no CADE já havia sido relatado por aquele ex-executivo à direção da Siemens, assim como a conexão com o escândalo da Alstom, investigado desde 2008, e que no mesmo agosto deste ano, resultou no indiciamento de dez pessoas, entre elas dois ex-secretários de Estado do PSDB de São Paulo.
Investigando a corrupção, a mais de 6 mil milhas de casa
O caminho que acabou por me levar a essa valiosa fonte havia começado 10 meses antes, no campus da Universidade da Califórnia em Berkeley, a mais de 6 mil milhas de São Paulo. Fluente em português, fiquei empolgado quando um professor me falou sobre seu interesse em investigar um escândalo de corrupção no Brasil, envolvendo centenas de milhares de dólares.
Desde 2008, a Justiça e a polícia na Suíça, França e, de forma mais pontual, na Inglaterra e nos Estados Unidos, tinham aberto investigações sobre o esquema de propinas da Alstom ao redor do mundo. Parte das investigações feitas na Suíça envolviam o Brasil e, depois de avisados pelos suíços, membros do Ministério Público de São Paulo também começaram a apurar pagamentos suspeitos feitos pela companhia, associados a contratos para fabricar, instalar trens, sistemas de sinalização e vagões do metrô na região metropolitana.
Depois de uma semana de pesquisa e conversa com jornalistas brasileiros, decidi procurar os membros do PT na Assembléia, que há dois anos tentavam abrir uma CPI para investigar o caso, bloqueada pela maioria governista (o PSDB, partido do atual governador paulista, está há 18 anos no poder no Estado).
Nem telefonei antes. Preferi me apresentar pessoalmente e peguei o metrô, embarcando em um vagão novinho com o logotipo da Alstom em todas as janelas. Tive que fazer duas baldeações e andar 1 km para pegar um ônibus para a Assembléia, o que resultou em uma viagem de duas horas. O que não é uma experiência rara para os usuários do precário sistema de transporte público de São Paulo.
Encontrei a assessora de comunicação do PT no hall do imponente prédio da Assembléia. Tomamos um café juntos e eu perguntei sobre o caso Alstom. Ela disse que seria melhor conversar com um dos deputados, o que teria que ser agendado, mas, enquanto isso, disse, ela poderia me entregar a cópia de um dossiê organizado pelo PT sobre o caso. Recebi o calhamaço com centenas de páginas de documentos presos por grampos. Não tive nem que tirar xerox.
O dossiê incluía contratos, relatórios policiais, dados estatísticos e uma coleção de matérias publicadas na imprensa brasileira. As informações indicavam que, entre 1989 e 2007, a Alstom e suas consorciadas ganharam pelo menos 139 contratos no valor de R$ 7,6 bilhões do governo do Estado de São Paulo. Quase todos os contratos eram referentes ao metrô de São Paulo e à Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Do total, quase R$ 1,4 bilhão se referiam a contratos considerados irregulares pelo Tribunal de Contas, de acordo com o dossiê.
Parte das informações já eram de conhecimento público. Em maio de 2008, a polícia suíça marcou uma reunião com membros do Ministério Público de São Paulo para falar sobre pagamentos de US$ 6,8 milhões que teriam sido usados como propinas para ganhar um contrato de US$ 45 milhões do metrô, de acordo com matéria do Wall Street Journal. Entre os documentos obtidos pelo repórter, alguns se referiam a aditivos de R$ 110 milhões, de 1998, que prolongavam a validade de um contrato assinado 15 anos antes.
Um memorando timbrado de 1997 a respeito desse contrato dizia bastante sobre o esquema. Nele, Bernard Metz, então executivo da Alstom informava a um colega que companhia pagaria 7,5% de propina pelo contrato a um indivíduo com as iniciais R.M. “É um pagamento para o governo local”, Metz escreveu em francês. “Está sendo negociado por um ex-secretário do governador”.
De acordo com as investigações policiais, esse ex-secretário era Robson Marinho, chefe de gabinete do governo Covas entre 1995 e 1997. Marinho, que depois se tornou conselheiro do Tribunal de Contas Estadual, o órgão de auditoria das contas públicas de São Paulo, muitas vezes deu o voto decisivo para aprovar a legalidade de contratos da Alstom hoje investigados. Ele chegou a admitir que assistiu a Copa do Mundo de 1998 em Paris às custas da Alstom – embora seja um homem próspero, dono de uma ilha no Rio de Janeiro e de um prédio de oito andares em um bairro nobre em São Paulo.
Em junho de 2009, as autoridades suíças bloquearam uma conta de Marinho sob suspeita de que tivesse sido usada pela Alstom para pagar propinas via depósitos offshore. No mês seguinte, o Ministério Público de São Paulo fez o mesmo com as contas bancárias de Marinho e de mais 18 suspeitos.
Outros documentos que obtive em São Paulo revelavam mais sobre o esquema atribuído a Alstom. Em depoimento juramentado ao MPE, em 2008, Romeu Pinto Júnior, suspeito de lavagem de dinheiro, disse que um ex-executivo da Alstom chamado Philip Jaffre, já falecido, havia montado várias companhias offshore no Uruguai e nas Ilhas Virgens para fazer circular secretamente os recursos da companhia que seriam pagos a políticos brasileiros. Os políticos recebiam em dinheiro, em encontros em restaurantes.
Em depoimento da mesma época, outro suspeito de lavagem de dinheiro, Luís Filipe Malhão e Sousa, disse ter usado várias empresas para distribuir as propinas da Alstom e lavado dinheiro através de vários bancos em Nova York. Mais de um milhão de dólares foram transferidos pelas empresas de Sousa nessas transações entre 1998 e 2002.
Em agosto de 2008, segundo documentos oficiais, pelo menos dez contratos da Alstom estavam sendo investigados pelo Ministério Público de São Paulo. Mas as tentativas do PT de abrir uma CPI continuavam sem obter os votos necessários na Assembléia.
Boa hora para um encontro rápido de muitas consequências
Enquanto rastreava o ex-executivo da Siemens, fui muitas vezes a Assembléia para conversar com deputados e assessores legislativos sobre os documentos compilados no dossiê. Em uma dessas visitas, ao entrar no departamento de pesquisas do PT, escondido em um canto da Assembléia, um homem magro, com alguns cabelos grisalhos disfarçando a careca, me disse, entusiasmado, que eu tinha chegado em boa hora. “Tem alguém aqui que eu quero que você conheça”. E saiu. Voltou pouco depois para me conduzir até uma sala de reuniões com uma mesa grande. Ali estava sentado um homem de olhar intenso, que me observava silenciosamente.
Depois de breves apresentações, ficou claro que o homem com quem eu estava falando era o ex-executivo da Siemens que eu procurava, com informações de primeira mão sobre a Alstom, Siemens e outras empresas que atuam no setor metroferroviário de São Paulo.
Contei-lhe o que já havia descoberto em minhas investigações sobre as acusações à Alstom. Do outro lado da mesa, ele me olhou e assentiu com a cabeça. Após uma conversa rápida, off the record, ele me disse: “Infelizmente você me pegou em um momento ruim, tenho que ir embora”. Antes de sair, porém, ele pegou uma pilha de papéis grampeados e me entregou. “Você é uma das pouquíssimas pessoas a ver isso”, disse. “Acho que vai achar interessante.” Pedi, mas não obtive seu contato e ele saiu rapidamente da sala, dizendo que eu poderia achá-lo através de meus conhecidos na Assembléia. Peguei um táxi e corri para casa para olhar os documentos.
Duas cartas e muitas revelações sobre o que se tornaria um escândalo
O primeiro era uma carta escrita em inglês endereçada ao Dr. Hans-Otto Jordan, em Nuremberg, Alemanha, em junho de 2008. Jordan, eu saberia depois, era o ombudsman da Siemens – um advogado contratado pela companhia para ouvir os empregados que quisessem fazer denúncias sobre práticas inapropriadas de negócios na companhia.
Na carta de oito páginas, o ex-executivo fornecia informações e documentos que compunham o que ele chamava “As práticas ilegais do presente e do passado da Siemens no Brasil”. E focava três contratos do setor de transportes metropolitanos com o cuidado de destacar que o mesmo esquema também era muito utilizado pelas divisões de equipamentos médicos e de energia da Siemens.
A primeira coisa que me chamou a atenção na carta foi o nível de detalhes sobre os casos relatados. Para cada contrato discutido, a fonte nomeava as companhias envolvidas, dizia os valores e a quem as propinas haviam sido pagas, nomeando os funcionários de alto escalão do governo de São Paulo e do Distrito Federal que receberam o suborno. Dois dos três contratos denunciados eram acordos para expandir o sistema metropolitano de trens. O primeiro era um contrato de 288 milhões de dólares, assinado em 2000, para ligar uma linha de trem – a G da CPTM – à linha 5 do metrô, a linha lilás, com apenas cinco paradas, que vai do Largo Treze ao Capão Redondo, no extremo da zona Sul de São Paulo.
Quase dois terços desse dinheiro vinha do governo de São Paulo; o resto tinha sido financiado pelo BID de acordo com os registros oficiais. Esse contrato, anexo à carta do executivo, tinha sido dividido entre várias companhias, incluindo a Alstom, a Siemens, a Daimler Chysler, a grande companhia espanhola CAF e vários pequenos parceiros e subcontratados.
Para garantir o contrato, a Alstom havia costurado um acordo com as outras companhias para oferecer preço inferior ao dos concorrentes na licitação da nova linha de metrô, segundo o ex-executivo. Depois, dividiriam o bolo. Cada uma das empresas pagaria uma parte das propinas aos funcionários do governo estadual, correspondentes a 7,5% do valor do contrato, segundo a carta.
Siemens e Alstom camuflavam o dinheiro das propinas através de duas companhias no Uruguai – Leraway Consulting e Gantown Consulting-, e duas brasileiras, Procint e Constech, de propriedade de Arthur e Sergio Teixeira, segundo a carta. Os recursos eram então transferidos para o Brasil onde as propinas eram pagas em dinheiro vivo. Os documentos dos contratos com as firmas uruguaias, assinados pela Siemens em Munique em abril de 2000, também foram anexados.
O próximo grupo de documentos se referia a contratos com o governo estadual para fabricar e colocar em operação dez trens comprados pela CPTM. Em 1997, a Siemens ganhou um contrato no valor de 103 milhões de marcos alemães para vender dez trens para a CPTM. Pelo acordo, a companhia dividiria o contrato com a empresa japonesa Mitsui, que se encarregaria do suporte e treinamento técnico; mas o papel verdadeiro da Mitsui, segundo a denúncia, era o de pagar propinas para os funcionários da CPTM, sempre de acordo com a carta do ex-executivo. “O contrato era apenas uma ‘cortina de fumaça’ para ocultar sua função real, que era subornar o cliente”, ele escreveu.
Cinco anos depois, a Siemens assinou mais um contrato com a CPTM para operar e manter os vagões vendidos em 1997. A companhia obteve o negócio subcontratando a empresa brasileira MGE Transportes, então dirigida por Ronaldo Moriyama, conhecido por “sua atitude agressiva e arriscada” ao subornar funcionários do governo para obter contratos, escreveu o ex-executivo, que chegou a nomear os que teriam recebido as propinas da MGE. “Muitos diretores do Metrô de SP e da CPTM estão na folha de pagamentos dele (Moriyama) há anos”, dizia a carta. “Os mais conhecidos eram: Décio Tambelli (ex-diretor de operações do Metrô), Jose Luiz Lavorente (ex-diretor de operações da CPTM) e Nelson Scaglione (Gerente de Manutenção do Metrô de SP ).”
O ex-executivo também detalhou o esquema de propinas da Alstom no Metrô em Brasília que, segundo a carta, funcionava há anos. Para garantir os contratos, a companhia pagava R$ 700 mil de propina por mês ao ex-governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz, e diretores do metrô, escreveu o ex-executivo. Quando a Siemens substituiu a Alstom no mesmo contrato, o governador Roriz não se incomodou, “desde que o vencedor da concorrência continue a pagar a ‘taxa’” dizia a carta. No final, o ex-executivo diz que o suborno continuava sendo uma prática da Siemens no Brasil, acrescentando: “Essa atitude conta com as bençãos do principal executivo da companhia no Brasil”.
Uma segunda carta endereçada ao Ministério Público
Uma segunda carta, essa escrita em português, em 2010, foi me entregue pelo ex-executivo. Depois eu descobriria que essa carta – dirigida a “Prezados Senhores – tinha sido remetida ao Ministério Público Estadual pela bancada do PT na Assembléia em fevereiro de 2011, com mais um pedido formal de investigação – o que vinha sendo feito pelo partido desde 2008.
Nela, o ex-executivo detalhava ainda mais o esquema de propinas da Siemens e o papel da MGE, subcontratada pela Siemens para executar o contrato de manutenção da CTPM, vencido em 2002, no valor de R$ 34 milhões. O verdadeiro propósito da parceria, dizia a carta, era canalizar propinas para os diretores da CPTM e para políticos do PSDB e do PFL (atual DEM) em São Paulo.
Durante os cinco anos de vigor do contrato, a Siemens transferiu à MGE mais de R$ 3 milhões para serem usados nas propinas, fingindo pagar por serviços que nunca foram realizados, de acordo com a fonte. O dinheiro era depositado nas contas pessoais dos diretores da MGE e pagos para o já citado José Luiz Lavorente, então diretor da CPTM. Segundo a carta, Lavorente guardava o seu quinhão e distribuía o restante a políticos de São Paulo. A MGE ficava com 23% do dinheiro das propinas, e a Siemens obtinha um grande lucro, superfaturando em até 30% os contratos da CPTM, segundo a carta. O mesmo arranjo era utilizado pela Siemens para ganhar licitações de contratos lucrativos com o Metrô de São Paulo e de Brasília, de acordo com o ex-executivo.
Mais uma vez as denúncias eram acompanhadas de documentos, dessa vez informes detalhados de pagamentos da Siemens à MGE de 2002 to 2006, com números de cheques e datas das transações para pagar as propinas. “O papel principal da MGE nos contratos com a Siemens Ltda. (Brasil) foi e continua sendo o pagamento de propina a diretores da CPTM, Metro SP e Metro DF (Brasilia)”, escrevia a fonte. “O cruzamento dos saques efetuadas pela MGE com os pagamentos efetuados pela Siemens a esta empresa pode provar o esquema milionário de corrupção patrocinado pela Siemens e MGE na CPTM, no Metro de SP e no Metro do DF.”
Por fim a tão sonhada entrevista
O potencial de impacto dessas informações era quase impensável. Antes de ir embora do Brasil, decidia que faria todo o possível para me manter em contato com essa fonte.
Mas isso não era nada fácil, como percebi nas semanas seguintes em que fui diversas vezes à Assembléia para tentar um novo encontro com o ex-executivo. Até que um dia, uma semana antes do dia marcado para o meu vôo de volta à Califórnia, dei de cara com o homem que havia me apresentado ao ex-executivo no mesmo departamento de pesquisas do PT.
“Que bom te ver”, ele me disse, sorrindo. “Falei com o seu contato ontem. Ele vai estar em São Paulo na quinta-feira e pode te encontrar às 6 da tarde”. Meu vôo partiria na manhã seguinte às 9h30 da manhã. “Vou chegar 15 minutos antes”, respondi.
Naquela noite quase não dormi. Arrumei a mala, escaneei meu cérebro em busca de cada detalhe que eu deveria perguntar e acabei indo para a cama de madrugada. No dia seguinte, na hora marcada, encontrei o ex-executivo na mesma sala que o vi pela primeira vez. Ele acenou e me disse “Olá, de novo”. Conversamos sobre os documentos e perguntei se poderia gravar a entrevista. Ele concordou, com a condição de manter o anonimato.
Durante os próximos 45 minutos, ele me deu a primeira e única entrevista já concedida sobre o esquema de propinas e de combinação de preço nas licitações que ele disse ter presenciado pessoalmente. Sempre que um contrato grande do setor metroferroviário é fatiado entre diversas empresas no Brasil, as práticas ilegais são comuns, ele disse.
“Existe sempre um acordo entre elas, uma divisão e um sobrepreço, ou seja, um cartel. Quando tem cartel, tem pagamento, obviamente”, explicou. “Está acontecendo agora (2010) no caso das reformas do metro. Também na manutenção dos trens da CPTM,” afirmou. Mais adiante ele diria que as subsidiárias brasileiras da Alstom e da Siemens mudaram alguns métodos de pagamentos de propinas depois das investigações na Europa.
“Antigamente ia para as contas na Suíça, para as offshores no Uruguai, mas ficou muito difícil fazer este tipo de pagamento de propina diretamente,” disse. “É por isto que, em geral, eles sempre levam um subcontratado. Imagina, uma Alstom, por exemplo, com uma fábrica aqui no Brasil. Porque precisaria subcontratar alguém para fazer um serviço? Não precisa. No fundo, o que acontece? Aqui precisa de alguém para fazer o trabalho sujo.”
Ele disse que o dinheiro das propinas permitiam às empresas ganhar contratos por preços absurdos e engordar os cofres dos partidos políticos no poder em São Paulo e no Distrito Federal. “Os intermediários ficam com uma parte, e a outra parte vai para os políticos,” disse. “Os políticos solicitam, induzem, vamos dizer assim. Eles querem contribuições para as campanhas, mas a maior parte fica para eles pessoalmente”.
No final da conversa, consegui perguntar uma coisa que estava na minha cabeça desde que li a carta enviada por ele ao ombudsman da Siemens em 2008. Como a Siemens havia respondido às acusações?
Um parênteses: Em dezembro de 2008, seis meses depois do executivo ter mandado sua carta anônima ao ombudsman, a Siemens havia se declarado culpada ao Departamento de Justiça americano por violações do “Foreign Corrupt Practices Act”, que proíbe as companhias com negócios nos Estados Unidos de pagar propinas em outros países. Como parte de um acordo com a corte americana, a Siemens admitiu ter pago mais de 800 milhões de dólares em propinas ao redor do mundo. No mesmo período, fechou um acordo semelhante com as autoridades alemãs, pagando uma multa total de 1,6 milhão de dólares. O Brasil, no entanto, não foi mencionado nesse esquema.
Voltando a entrevista em São Paulo: o ex-executivo disse que nunca recebeu qualquer sinal de que a Siemens tivesse ido atrás das informações fornecidas na sua carta, apesar das promessas da companhia de reestruturar suas práticas para acabar com a corrupção.
“A Siemens abafou o caso no auge da crise, no momento em que diziam querer limpar tudo. Foi como se nunca tivesse acontecido. Ninguém falou nada, ninguém foi mandado embora. A coisa aconteceu como se fosse tudo normal,” contou o ex-executivo.
“Por algum motivo, o Brasil sempre ficou intocado. A minha interpretação é que eles sabem que isso tem que continuar, e não querem fazer muito barulho, porque eles sabem que se não continuar, eles vão ter menos contratos. E isto é verdade.”
Mais uma vez pedi o contato dele quando a entrevista terminou, e mais uma vez ele me disse que eu teria que procurá-lo através dos nossos conhecidos na Assembléia. E mais uma vez, ele saiu apressado do escritório, desaparecendo no burburinho da metópole.
De volta à Califórnia
Depois de algumas semanas organizando o material coletado no Brasil, contatei o Departamento de Justiça dos Estados Unidos para saber se, durante as negociações daquele acordo, o Brasil realmente não havia sido citado. Foram semanas de telefonemas até conseguir falar com um porta-voz, que disse que o Departamento não comentaria esse assunto.
Diante do aparente beco sem saída, recorri ao professor que tinha me colocado na história das propinas no Brasil, Lowell Bergman, jornalista premiado com o Pulitzer e diretor do programa de Jornalismo Investigativo da UC Berkeley. Alguns anos antes, quando ele preparava um especial de televisão sobre propinas pagas por companhias no exterior para ganhar concorrências fora dos Estados Unidos, tinha conseguido uma fonte no Departamento de Justiça que havia trabalhado no acordo das propinas com a Siemens.
Mas a fonte disse que não havia menção da Siemens sobre subornos no Brasil e Bergman e eu decidimos confirmar se realmente o ex-executivo brasileiro havia mandado a tal carta para a Siemens na Alemanha. Depois de muita conversa em off com uma fonte da Siemens, ouvi que a companhia tinha realmente recebido a carta em 2008. Mas, como a informação não podia ser confirmada, eu tinha que verificar na própria companhia.
Em fevereiro de 2011, entrei em contato com a assessoria de imprensa da sede da Siemens por email e comecei a ligar para Munique tarde da noite, para compensar as nove horas de diferença de fuso horário. Eu havia feito perguntas bem específicas no meu email: A Siemens tinha informado as autoridades nos Estados Unidos e na Alemanha sobre as denúncias de propinas no Brasil feitas em uma carta enviada ao ombudsman em junho de 2008? Se sim, quando? A companhia tinha remetido a carta para as autoridades?A Siemens tinha aberto um procedimento interno para investigar o assunto? Se sim, quando?
No mês seguinte, o assessor de imprensa respondeu ao email: “Como parte da cooperação em andamento com as autoridades americanas, a Siemens informou ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos e à Comissão de Valores Mobiliários (Securities and Exchange Commission) sobre as denúncias anônimas que foram submetidas por carta ao ombudsman”, escreveu o porta-voz no email.
Quanto às outras questões, foram respondidas em termos muito genéricos: “Como a Siemens não comenta investigações ou processos investigativos, está impossibilitada de comentar as ações específicas ou investigações independentes assumidas pela Siemens em resposta às denúncias,” escreveu, para concluir: “Em relação aos esforços globais de monitoramento da Siemens, incluindo o Brasil, tomou medidas inéditas de autocorreção e limpeza que foram reconhecidas pelos órgãos dos Estados Unidos como ‘extraordinárias’ e ‘as melhores do gênero’. Nós levamos a sério nosso compromisso com altos padrões éticos e temos uma política de ‘tolerância zero’ com desvios”.
Em outubro de 2011, a companhia demitiu o presidente das operações brasileiras, Adilson Primo, que ocupava o cargo há tempos, afirmando que “uma investigação interna revelou, recentemente, uma grave violação às diretrizes da Siemens na subsidiárias brasileira antes de 2007”. Reportagens ligaram a demissão à descoberta de uma conta privada com cerca de 6 milhões de euros de recursos da Siemens. Um porta-voz disse que a saída de Primo não tinha relação com a carta do denunciante.
Meses depois, em uma apresentação da companhia em janeiro de 2012, a Siemens confirmou que estava sob investigação do Ministério Público em Brasília. Em maio de 2013, o escândalo estourou no CADE.
Grande parte da informação que veio da delação da Siemens ao CADE, corrobora as alegações do ex-executivo. Emails e outros documentos indicam que a companhia associada a outras empresas operava como um cartel para ganhar contratos do governo por preços superfaturados entre 1998 e 2007. Esses contratos faziam parte dos acordos entre Siemens e Alstom para fabricar, manter e instalar trens em São Paulo e Brasília. Os três contratos citados pelo ex-excutivo estão sob investigação, incluindo o da Linha G de trem e lilás de metrô. Até a porcentagem de faturamento – 30% – que consta dos documentos entregues pela Siemens ao CADE, segundo o Estadão, é a mesma. Ao todo, dez promotores vão conduzir 45 inquéritos para investigar atividades suspeitas da Alstom, Siemens e outras em contratos que somam R$ 1,9 bilhão apenas no Estado de São Paulo.
No começo desse mês de agosto, a revista IstoÉ, em uma grande reportagem sobre o escândalo, revelou indícios de que o dinheiro das propinas da Alstom e da Siemens no setor metroferroviário de São Paulo ajudou a eleger os quatro últimos governadores de São Paulo. Muitos dos que foram acusados de receber propinas na reportagem da revista eram os mesmo citados pelas cartas do ex-executivo, incluindo o ex-diretor de operações da CPTM, José Luiz Lavorente, e o ex-diretor de operações do Metro de São Paulo, Décio Tambelli.
Novas revelações devem surgir da colaboração da Siemens com os investigadores brasileiros. Mas, os fatos têm mostrado que as acusações do ex-executivo têm fundamento. Ainda assim, Paulo Stark, chefe da subsidiária brasileira da Siemens, afirmou, em depoimento, que “desde 2007”, tem um “sistema de monitoramento para detectar, prevenir e remediar práticas ilícitas que possam ter sido adotadas, encorajadas ou toleradas por empregados ou executivos em qualquer lugar do mundo”.
Felizmente, a carta que me foi entregue pelo ex-executivo da Siemens acaba de ser publicada no Brasil – ela estava disponível, assim como a íntegra do meu trabalho no site da Universidade de Berkeley. E as multinacinacionais do setor metroferroviário terão ainda mais a explicar aos conselheiros do CADE.
publicado originalmente em Agência Pública

sexta-feira, 26 de julho de 2013

O TREM DE ALTA VELOCIDADE ESPANHOL NÃO POSSUÍA O EQUIPAMENTO DE SEGURANÇA QUE REDUZ A VELOCIDADE?


No vídeo do sistema de segurança da Renfe, observa-se que o segundo vagão já entra na curva descarrilhando. Provavelmente, por ser mais leve que a locomotiva, já estava instável desde o início da curva. Ao tombar, leva em efeito dominó os outros vagões de passageiros e por fim, até a locomotiva.


O acidente com o trem de alta velocidade espanhol, dia 24 de julho, que já acusa 78 mortos, deixa uma pergunta no ar: não havia o equipamento eletrônico de redução de velocidade? Em todo metrô existe este equipamento, chamado popularmente pelo nome de marca Wee Z-Bond. O trem de alta velocidade espanhol entrou a 180 km/h em uma curva que deveria ser feita a 80 km/h. Por que esse excesso de 100 km/h não foi bloqueado, se representava um risco à segurança do trem? Caberia somente ao piloto-maquinista essa operação?

Chamado popularmente de Z-Bond, o aparelho eletrônico detecta a passagem dos trens. Está instalado sobre um dormente e é alimentado por energia elétrica. Quando o primeiro trem passa, o Z-Bond determina a distância mínima de segurança para que o segundo trem tenha de manter do primeiro.

Além disso, o Z-Bond pode ser apenas programado para reduzir a velocidade de um trem que passar por ele e esteja acima da velocidade da via. Por exemplo, em uma via que a velocidade seja de 80 km/h (metrôs em geral, como São Paulo ou Brasília), se um trem passar a 110 km/h, ele automaticamente terá a velocidade reduzida para o limite de 80 km/h.

Se o Z-Bond estiver programado para manter distância entre dois trens, ele pode inclusive fazer o segundo trem parar até o primeiro trem ficar a uma distância considerada segura. Por isso os trens de metrôs circulam a distâncias tão curtas e a intervalos de tempo tão reduzidos.

Na foto, um Wee Z-Bond instalado sobre o dormente de concreto. Os cabos conectados são de energia elétrica e de dados. Ao que o trem passa sobre ele, aciona o equipamento que reduz a velocidade ou mesmo pára o trem.


Então, o que nos surpreende é por que o trem de alta velocidade espanhol não possuía em funcionamento o Z-Bond, que é um equipamento padrão em metrôs e deveria ser um equipamento padrão em trens de alta velocidade...

Essa pergunta é chave para responder o por quê do acidente com o Trem de Alta Velocidade Espanhol da Renfe? É importante mencionar que a Renfe é uma empresa privada que adquiriu a exploração do Trem de Alta Velocidade durante as privatizações espanholas. Será que por economia de custos, a Renfe não teria instalado os Z-Bonds ou mesmo retirado os equipamentos?

Existe uma prática nociva de reduzir os gastos com segurança ferroviária para aumentar os lucros, já que os equipamentos de segurança não custam poucos centavos. Será que foi o ocorrido na Espanha?

terça-feira, 23 de julho de 2013

Desde o ano 2000 é mais barato ter um automóvel que pagar as passagens de ônibus (ou metrô quando existe) nas cidades brasileiras. A constatação é de um estudo do IPEA, de julho de 2013


Fonte: elaboração própria com base em IPCA (IBGE). Nota ¹ -Regiões Metropolitanas de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre, Brasília e o município de Goiânia.

        Há alguns anos estamos afirmando que os estímulos à indústria automobilística, somados às autorizações para aumentos dos preços do Transporte Público levaram o Brasil a uma situação irreal: é mais barato manter um carro do que pagar as passagens de ônibus.

          E como fosse pouco, os empresários de ônibus operam um sistema que não emite Nota Fiscal para seus clientes. Ou seja, o passageiro não recebe uma Nota Fiscal  para cada passagem que compra. 

             Assim, quando vão negociar com as prefeituras e governos estaduais, os empresários de ônibus levam planilhas feitas por eles mesmos, com valores elaborados por eles mesmos, sem qualquer verificação de verdade pela inexistência do controle do caixa das empresas, já que elas não emitem Nota Fiscal . 

            Se um camelô tem suas mercadorias apreendidas por não ter Nota Fiscal, por que os empresários de ônibus podem fazer um serviço sem emitir Nota Fiscal?

      Se acusa-se  os  camelôs de estarem vendendo produtos que tem origem na criminalidade, o que se pode dizer dos empresários de ônibus, que vendem um serviço (péssimo) sem emitir Nota Fiscal?

                                Enquanto isso, a Indústria Automobilística...



Esquerda: restos do complexo de fábricas e escritórios da Packard, a maior fábrica de automóveis em Detroit. À direita, restos da fábrica da Cadillac. Quando as vendas de automóveis chegaram ao limite, as fábricas fecharam e demitiram. Em alguns casos, mudaram suas linhas para países com mão-de-obra mais barata, onde podiam ter lucros maiores.

           Ao mesmo tempo, as cidades não cabem mais a quantidade de automóveis que são fabricados no Brasil com toda sorte de incentivos: isenção do IPI, doação de terrenos, isenção de ICMS, instalação gratuita de água, esgoto e energia. São 39 milhões de novos automóveis desde 2000. Enquanto isso, a população cresceu somente 25 milhões!

            E tudo isso para uma indústria que possui uma tradição de abandono e de demissão de empregados. No Brasil, a Chrisler recebeu apoio do governo paranaense para se instalar. Com menos de 3 anos de funcionamento, fechou a fábrica em S. José dos Pinhais por ordem da matriz norte-americana, demitindo mais de 1.200 empregados. A GM encerrou a linha de produção do Corsa e demitiu mais de 1.800 empregados na fábrica de S. José dos Campos. 

          Nos EUA, as fábricas demitiram e fecharam até mesmo em Detroit, levando à prefeitura da cidade pedir falência em julho de 2013. Quando não há mais compradores, as fábricas simplesmente fecham. 

       E  é exatamente esse quadro que estará se repetindo no Brasil se as indústrias automobilísticas e as empresas de ônibus comandarem a Economia e o Transporte Público: após lucrarem bilhões, fecharão as portas e deixarão apenas desemprego e miséria.

domingo, 14 de julho de 2013

  

Empresa alemã Siemens delata cartel em licitações do metrô de SP

CATIA SEABRA
JULIANA SOFIA
DIMMI AMORA
DE BRASÍLIA

          A multinacional alemã Siemens delatou às autoridades antitruste brasileiras a existência de um cartel --do qual fazia parte-- em licitações para compra de equipamento ferroviário, além de construção e manutenção de linhas de trens e metrô em São Paulo e no Distrito Federal.
           Gigante da engenharia, a empresa já foi condenada em outros países por conduta contra a livre concorrência.


         A Folha de Sao Paulo apurou que o esquema delatado pela companhia envolve subsidiárias de multinacionais como a francesa Alstom, a canadense Bombardier, a espanhola CAF e a japonesa Mitsui.

        Essas empresas e a Siemens são as principais candidatas a disputar o megaprojeto federal do trem-bala que ligará Rio e São Paulo. O leilão deve ser no mês que vem.
Combinações ilícitas entre empresas podem resultar em contratações com preços superiores (entre 10% e 20%, segundo estimativas) aos praticados caso elas concorressem normalmente.

        No início do mês, a Superintendência-Geral do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) realizou busca e apreensão nas sedes das companhias delatadas. A Operação Linha Cruzada executou mandados judiciais em São Paulo, Diadema, Hortolândia e Brasília.

        Segundo as denúncias, o cartel atuou em ao menos seis licitações. Mas ainda não se sabe ao certo o tamanho real, alcance, período em que atuou e o prejuízo causado.
Ao entregar o esquema, a Siemens assinou um acordo de leniência, que pode garantir à companhia e a seus executivos isenção caso o cartel seja confirmado e condenado.

        A imunidade administrativa e criminal integral é assegurada quando um participante do esquema --antes que o governo tenha iniciado apuração-- denuncia o cartel, suspende a prática e coopera com as investigações. No caso de condenação, o cartel está sujeito a multa que pode chegar a 20% do faturamento bruto da empresa no ano anterior à abertura de processo pelo Cade.

        No final da década de 90, houve uma troca no comando mundial da Siemens depois de escândalos de pagamento de propina em vários países. A empresa foi punida no exterior por formação de cartel.

        A análise do material apreendido levará até três meses. Confirmados os indícios de cartelização, o Cade abrirá processo contra as envolvidas. O conluio, segundo a apuração, inclui outras sete empresas: TTrans, Tejofran, MGE, TCBR Tecnologia, Temoinsa, Iesa e Serveng-Civilsan.

terça-feira, 14 de maio de 2013

ÔNIBUS COM PORTAS DO LADO ESQUERDO?              

SÓ EM LONDRES!



         Nos demos ao trabalho de irmos a Europa para mostramos aos brasileiros (especialmente aos brasilienses) que ônibus com portas do lado esquerdo só existe em países que o tráfego seja pelo lado esquerdo, como a Inglaterra.


         Seria impensável, em um país como a Inglaterra, que um governo estadual resolvesse fazer ônibus com portas do lado oposto da calçada. Quando falávamos disso com os especialistas e gestores do transporte público de Londres e Madri, a resposta foi quase sempre uma pergunta se "esses sujeitos em Brasília são loucos ou não entendem o fazem?"


         Além disso, as cidades europeias evitam a construção de avenidas e ruas muito largas, pois o investimento principal é na construção de metrôs e Veículos Leves sobre Trilhos.
         O vídeo que apresentamos é o primeiro de uma série rápida sobre o transporte de Londres e Madri, onde estivemos em maio de 2013. vejam e tirem suas próprias conclusões sobre os projetos de corredores de ônibus com portas do lado esquerdo, que estão sendo construídos em Brasília.

terça-feira, 16 de abril de 2013